quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

ENCONTRO ANUAL DA 3ª COMPANHIA DO BATALHÃO DE CAÇADORES 4611/72 - FIGUEIRA DA FOZ (2ª PARTE)

Por Artur Girão


38 Anos depois; FOI O REGRESSO.


Voltar a pisar Lisboa foi das coisas boas que sentimos. Finalmente terminava o pesadelo de se ser soldado.
Sempre tive muita alergia a fardas – às dos militares. Talvez por se manifestarem numa cadeia de comando em que só alguns têm o direito de pensar.
Todos devem obedecer… E morrer se for caso disso. Mas quem manda não morre em combate. Envelhece com condecorações ao peito e reforma gorda.
Não se nasce soldado. Não se tem vocação – a não ser que a crueldade seja como complemento do ser.
Aprende-se a matar com muita facilidade e, depois vem a cadeia de comando que não se interroga.
Chegámos sem farda. Parecíamos um bando de colegiais a descer do avião.
Voltámos homens marcados por dois anos de vivências estranhas que nunca mais iríamos esquecer.

Mas voltar a pisar Lisboa foi muito bom. Regressar foi uma experiência fantástica.
Pela forma como éramos esperados pelos pais, irmãos, namoradas, amigos.
Pelas lágrimas de alegria de quem nos esperava e pelas que chorámos também.
Pela esperança de que nunca mais haveria pretexto para voltarmos à guerra. A uma guerra que não nos dizia nada – a consciência tinha ditado que os povos têm direito a ser livres de colonizadores.

E o tempo que vivemos a seguir foi de euforia, liberdade, paz. Também de procura, perdidos que estávamos numa sociedade diferente.
O 25 de Abril tinha modificado e muito a maneira de pensar e viviam-se tempos de um país modificado – sem guerra, mas com lutas políticas.
Nunca se tinha vivido assim.

E foi o retomar ou transformar a vida. No meu caso transformei a vida. Abandonei Viseu e vim para Lisboa.
Em Oeiras nasceu a minha filha, já nasceram os netos.
A vida, passados 38 anos, alterou-se muito. Percorremos os caminhos que quisemos ou aqueles que se nos foram deparando.
Estamos sempre a andar para qualquer lugar na procura de qualquer coisa e agora que muitos já reformados, é o muito ou o pouco, o tudo ou o nada.
Mas encontramo-nos todos os anos depois de 25 anos passados do regresso.
Estivemos 25 anos sem nos encontrarmos? Foi. Como? 25 anos? Foi.
Um obrigado com um grande abraço ao Vitor Fernandes que pacientemente foi procurando este e aquele para almoçarem na Bairrada.
A ele devemos estes encontros anuais que nos ajudam a sentir amizade – um grande abraço para ele.
Podia contar essa história de pouco a pouco ir procurando um telefone, uma morada, um apelido, ….   

Tem sido bom viver a amizade que nos move.
Chegar e ver este e aquele, mais um outro e, depois outro e …estamos lá quase todos.
Sentimos a falta dos que não estão.
Estar com amigos, que nos dão um abraço e perguntam como vais…. É muito bom.
Alguns já não comparecem… recordo-os com amizade.
Companheiros na enorme vontade de regressar, chegaram com um sorriso nos lábios e um coração aberto.
Não quis a vida que chegassem até hoje.

Bom………. Vai longo o discurso.


Um abraço a todos os que comigo trilharam as picadas do Cuando Cubango a Cabinda.

2 comentários:

Luis Marques disse...

Amigo Girão:
Gostei imenso de ler o texto sobre os sentimentos por ti vividos aquando do teu regresso de Angola em Novembro de 1974 e do teu percurso de vida após esse regresso.
Também a amizade pelos teus camaradas que flui em parte da tua escrita me satisfez, até porque comungo dos mesmos sentimentos que tu.
Daqueles tempos de Angola é sobretudo essa amizade que ainda perdura. Isso e uma enorme saudade daqueles que já não estão fisicamente connosco (no meu caso pessoal acompanhada de uma saudade daquela terra de Angola). Da guerra não guardo saudades. Tenho saudades dos meus amigos e por isso me junto com eles sempre que surge a ocasião. É por esses amigos, e também para brindar àqueles que já se foram, que percorro este país de norte a sul para os encontrar e abraçar.
Assim foi mais uma vez na Figueira de Foz…

José Manuel Francês disse...

Girão, ao ler o belo texto,bem representativo do sentimento que a maioria de nós nutre, fazes relembrar que afinal a "guerra" serviu para alguma coisa... talvez a mais importante, que foi ter-nos conduzido a locais maravilhosos desde as Terras do fim do Mundo a Cabinda e acima de tudo ter feito germinar nos nossos corações um sentimento único, fraternal, que é a Amizade que nos une, não só nos convívios que vamos fazendo e onde nos reencontramos, mas sobretudo na vontade que todos os dias sentimos de nos revermos, de falar,de viver juntos.

Obrigado pois Camarada e Amigo!

BATALHÃO DE CAÇADORES 4611/72

BATALHÃO DE CAÇADORES 4611/72
conduta brava e em tudo distinta